29.11.13

Dia da Livraria e do Livreiro 2013


Assinala-se amanhã o Dia da Livraria e do Livreiro.
Não deixe de comprar um livro e passar por uma livraria.

Mais informações: http://diadalivrariaedolivreiro.wordpress.com/

28.11.13

Os Sete Demónios


Os Sete Demónios é um livro de contos subordinado à temática do Natal, com um título assaz curioso para um livro cheio de religiosidade e de adoração por essa celebração festiva. Editado em Lisboa, no ano de 1926, pela Emprêsa Literária Fluminense, encontra-se assinado por Maria Magdalena. Contudo, o nome da autora é muito parco para revelar a enorme escritora, ensaísta e poetisa que viveu muitos anos em Pombal, numa propriedade que a família possuía em Flandes. Referimo-nos a Maria Madalena Valdez Trigueiros de Martel Patrício, filha de João Campelo Trigueiros Martel e Maria Henriqueta Mascarenhas Godinho Valdez, nascida em Lisboa a 19 de Abril de 1884 e falecida em 1947.

Martel Patrício publicou em 1915 o seu primeiro volume de poemas, em francês, intitulado Le Livre du Passé Mort, que mereceu as mais elogiosas referências da crítica, seguindo-se outras obras de prosa, poesia e ensaio, tanto em língua francesa como portuguesa. Nas suas Memórias, Raul Brandão escreveu: “Madalena Trigueiros de Martel Patrício, pequenina, vivíssima compleição de artista, gostos aristocráticos, fazendo versos em francês e duma alegria comunicativa”.

Martel Patrício correspondia-se com Selma Lagerlöf, prémio Nobel da Literatura em 1909, com o Visconde Júlio de Castilho ou com Maria Amália Vaz de Carvalho, entre tantos outros notáveis da cultura portuguesa e internacional. Fez parte do Instituto de Coimbra, da Associação dos Arqueólogos Portugueses e pertenceu à Société des Gens de Lettres de France. Colaborou em várias revistas e jornais e manteve uma secção dedicada especialmente às mulheres e às crianças, no jornal O Comércio do Porto.

No livro, Os Sete Demónios, destaque para o conto Os pêssegos, escrito em Flandes, Pombal, em Outubro de 1926, onde a autora narra a história do padre António da Conceição, também conhecido por Beato António, a caminho do mosteiro de Santa Maria da Batalha onde iria dizer a missa de Natal. Curiosamente, a personagem, o Beato António, religioso da Congregação de S. João Evangelista, nasceu em Pombal a 12 de Maio de 1522 e morreu em Maio de 1602, tendo sido beatificado logo após a sua morte1. 

No seu livro autobiográfico Le Rosaire de la Vie: Les Fleurs d’Amandiers, Martel Patrício refere as célebres tijeladas de Pombal, tão apreciadas pelos soldados de Napoleão e que faziam as suas delícias2, entre tantas outras referências e histórias sobre a vida social e cultural do seu tempo na então Vila de Pombal. Alguns dos seus livros estão disponíveis para consulta na Biblioteca Municipal de Pombal, no Fundo de Autores Locais.

Em 1934, Maria Madalena de Martel Patrício foi nomeada para o Prémio Nobel de Literatura, por António Pereira Forjaz e Bento Carqueja, membros da Academia Real das Sciencias de Lisboa, que, nesse ano, seria atribuído a Luigi Pirandello.


Notas
1 Cfr. Agostinho Gomes Tinoco, Dicionário de Autores de Leiria, Leiria, 1979, p. 129.
2 Cfr. Maria Madalena de Martel Patrício, Le Rosaire de la Vie: Les Fleurs d’Amandiers, Sociedade Industrial de Tipografia, Lisboa, 1937-1938, p. 189.

21.11.13

Ruas com livros dentro

Por todas as cidades é frequente encontrar uma ou outra placa toponímica homenageando escritores portugueses, uns porque aí nasceram, outros porque aí habitaram. Mas nunca o homenageado foi o próprio livro. E isso encontra-se em Pombal, ao longo de vinte e seis ruas, numa pequena biblioteca com vinte e seis livros. Imagine, caro leitor, o que é dizer aos seus amigos, quando lhes indica a sua morada, que vive na Rua das Gaivotas em Terra, referência ao primeiro romance de David Mourão-Ferreira, ou então no Beco d’Os Gatos, obra de Fialho de Almeida. Certamente ficarão estupefactos e lhe perguntarão, desconfiados, se é mesmo verdade. Pode acreditar. Mas ainda há mais. Por exemplo, a Rua d’A Musa em Férias, de Guerra Junqueiro, a Rua d’Os Adoradores do Sol, de Fernando Namora ou a Rua do Pranto de Maria Parda, de Gil Vicente. Uma verdadeira biblioteca de obras portuguesas se acha pelas ruas da cidade de Pombal, no centro do país.


Tudo aconteceu em 1996, quando em reunião de Câmara, a 4 de Outubro, o Município de Pombal deliberou as denominações toponímicas a atribuir para algumas ruas da cidade de Pombal e da Charneca, privilegiando os livros em si e não directamente os seus autores. Este será talvez um dos melhores elogios que alguma vez se realizaram em Portugal em prol da nossa literatura. Seguramente será também uma boa promoção do livro e da leitura, tão importante nos dias da iliteracia de hoje. Quantos dos seus moradores não se terão já questionado sobre aquele livro que designa a rua onde habita e não terão partido à sua descoberta.

Não querendo pecar por míngua ou omissão, prefiro correr o risco de ser fastidioso mas deixar registado em letra redonda os livros que se podem passear por Pombal. Assim, encontramos, além das referidas, a Rua d’O Fidalgo Aprendiz (D. Francisco Manuel de Melo); a Rua d’Os Lusíadas (Luís Vaz de Camões); a Rua da Cartilha Maternal (João de Deus); a Rua (António Nobre); a Rua dos Emigrantes (Ferreira de Castro); a Rua d’O Monge de Cister (Alexandre Herculano); a Rua Menina e Moça (Bernardim Ribeiro). — Na Urbanização da Bela Vista: Rua da Mensagem (Fernando Pessoa); Rua d’A Morgadinha dos Canaviais (Júlio Dinis). — Na Urbanização de São Cristovão: Rua d’O Primo Basílio (Eça de Queiroz); Rua d’A Sibila (Agustina Bessa-Luís); Rua do Leal Conselheiro (D. Duarte); Rua d’A Sobrinha do Marquês (Almeida Garrett); Rua da Estrela Polar (Vergílio Ferreira). — Na Urbanização da Senhora de Belém: Rua da Peregrinação (Fernão Mendes Pinto); Rua do Memorial do Convento (José Saramago); Rua d’Este Livro Que Vos Deixo (António Aleixo); Rua do Amor de Perdição (Camilo Castelo Branco); Rua do Orfeu Rebelde (Miguel Torga); Rua das Décadas da Ásia (João de Barros). E por fim, na Charneca, nada mais a propósito do que a Rua da Charneca em Flor (Florbela Espanca).

Só mais um pequeno conselho, caro leitor. Antes de iniciar o seu passeio à descoberta da nossa literatura, vá munido de um sápido lanche. Procure pelas bandas do Largo do Cardal pelas queijadas da Ti Maria Rata ou pelos Cardalinhos, verdadeiros ex libris da doçaria pombalense. Vai ver que o passeio lhe sabe pela vida.

1.11.13

O meu primeiro dicionário

Sempre gostei de dicionários e tenho por eles um particular fascínio. Dicionários que vão desde o Vocabulário de Bluteau ao Dicionário de Zoologia, do Dicionário de Domingos Vieira ao Dicionário Houaiss, só para citar alguns exemplos.

Quando pequeno era curioso e cedo manifestei uma grande vontade de saber, de conhecer, de compreender como o mundo e as coisas funcionavam. Infelizmente, em minha casa, não existiram dicionários durante alguns anos.


Foi em casa de um amigo que desenvolvi uma secreta paixão por um dicionário que ele então possuía e ao qual não dava importância nenhuma, tendo-o por lá abandonado a um canto. Quando o visitava, entre uma e outra brincadeira, quedava-me a folhear aquele repertório de informação. Era um Dicionário Enciclopédico Ilustrado que, além das palavras, possuía também vários retratos, mapas e diagramas que mostravam o porquê das coisas e quem eram aquelas estranhas figuras. Tanto namorei o dito que certo dia fiz uma proposta de troca ao meu amigo: dava-lhe o meu pequeno navio de guerra, em metal, belo e exuberante — naqueles tempos sonhava em ser marinheiro, e aquele era o meu totem, o emblema que representava o meu sonho futuro de rapazola — pelo seu dicionário, velho e gasto, com algumas páginas rasgadas e um ar bastante antiquado. Nem pensou duas vezes. A alegria foi imensa, creio que para ambas as partes.


Nessa noite demorei-me a virar as páginas, vislumbrando e maravilhando-me com o que aquele dicionário continha, abraçado a ele como se fosse um velho sábio que tinha tudo para me ensinar. Ainda hoje o estimo e guardo junto dos outros que entretanto foram ampliando a minha secção de dicionários.


O meu primeiro dicionário foi o Dicionário Enciclopédico Brasileiro Ilustrado (4.ª ed., 1953), com uma capa forrada a tecido, de toque agradável. Foi lá que aprendi os deuses da mitologia grega e romana; o nome de muitos escritores e suas obras; quem tinham sido Beethoven, Bizet ou Mozart e o que compuseram; sobre a Idade Média, com os cavaleiros e as armaduras ou os Índios, da América do Norte ou da Amazónia; tudo com ilustrações que faziam agigantar a minha imaginação.


Durante muitos e largos anos, aquela foi a fonte onde fui saciar a minha curiosidade. Em boa hora decidi trocar um brinquedo por outro que me abriu os horizontes, não marítimos, mas intelectuais.